Antero de Quental nasceu nos Açores, em 1842, e suicidou-se em 1891, no lugar de nascimento.
Teve vida complicada por causa de seus conflitos íntimos que o levavam a se isolar às vezes, em outras vezes, a conviver em reuniões literárias ou partidárias, a filosofar materialisticamente em certos períodos, em outros, a debater-se na dúvida religiosa.
Foi protagonista da Questão Coimbrã em defesa das ideias realistas dos jovens, culminando com o artigo “Bom-senso e Bom-gosto”. Seu suicídio parece ter sido consequência de uma doença física e uma mental: impôs-se questionamentos filosóficos e religiosos para os quais não obteve respostas.
Delineiam-se, em Antero de Quental, três fases distintas. Na primeira delas, nota-se o predomínio de uma atitude romântica em temática religiosa. É uma poesia de entusiasmo adolescente, herança da educação paterna. Esse conteúdo é identificado em quase todos os poemas dos livros Raios de extinta luz e Primaveras românticas.
Antero de Quental insistia que a sua obra tinha de ser revolucionária para corresponder ao seu tempo social, por isso os poemas dessa fase refletem o drama social da segunda metade do século XIX. A terceira fase, mais nítida no livro Sonetos, revela o poeta atormentado por questões humanas, filosóficas e metafísicas, resultando uma poesia dilemática, angustiada e pessimista, envolvida com ideias de morte e tentativas de explicar e entender Deus.
Leia agora, em linguagem original, 3 sonetos do Antero de Quental
MAIS LUZ!
(A Guilherme de Azevedo)
Amem a noite os magros crapulosos,
E os que sonham com virgens impossiveis,
E os que inclinam, mudos e impassiveis,
Á borda dos abysmos silenciosos...
Tu, lua, com teus raios vaporosos,
Cobre-os, tapa-os e torna-os insensiveis,
Tanto aos vicios crueis e inextinguiveis,
Como aos longos cuidados dolorosos!
Eu amarei a santa madrugada,
E o meio-dia, em vida refervendo,
E a tarde rumorosa e repousada.
Viva e trabalhe em plena luz: depois,
Seja-me dado ainda ver, morrendo,
O claro sol, amigo dos heroes!
These e Antithese
I
Já não sei o que vale a nova idea,
Quando a vejo nas ruas desgrenhada,
Torva no aspecto, á luz da barricada,
Como bacchante após lubrica ceia...
Sanguinolento o olhar se lhe incendeia;
Respira fumo e fogo embriagada:
A deusa de alma vasta e socegada
Eil-a presa das furias de Medea!
Um seculo irritado e truculento
Chama á epilepsia pensamento,
Verbo ao estampido de pelouro e obuz...
Mas a idea é n'um mundo inalteravel,
N'um crystallino céo, que vive estavel...
Tu, pensamento, não és fogo, és luz!
Hymno á Razão
Razão, irmã do Amor e da Justiça,
Mais uma vez escuta a minha prece.
É a voz d'um coração que te appetece,
D'uma alma livre, só a ti submissa.
Por ti é que a poeira movediça
De astros e soes e mundos permanece;
E é por ti que a virtude prevalece,
E a flor do heroismo medra e viça.
Por ti, na arena tragica, as nações
Buscam a liberdade, entre clarões:
E os que olham o futuro e scismam, mudos,
Por ti, podem soffrer e não se abatem,
Mãe de filhos robustos, que combatem
Tendo o teu nome escrito em seus escudos!
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